segunda-feira, fevereiro 06, 2006

A Palidez dum Triunfo

Passo os olhos por uma colectânea de pensamentos sobre a Liberdade e encontro este, de Abe Kobo:
«A liberdade não consiste só em fazermos a nossa vontade; por vezes consiste também em lhe desobedecer».
Máxima fecunda, por reconhecer que a tirania dos desejos imediatos e terrenos é tão potencialmente escravizadora como outra qualquer. E por muito que algumas correntes psicologistas teimem em negar a autonomia da vontade, dando-a como mera corrente de transmissão de peripécias anteriores, nada se consegue cabalmente explicar sem ela. Nem se poderia falar nas doenças da vontade, pois enfermo não pode estar o que inexiste. Ouspenski cortou com Gurdjeff, em grande parte, por achar que o seu mestre não dava relevo bastante a essa entidade e não a explicava suficientemente. Mas todas as denegações ou mitigações do reduto e da fonte do querer têm, se não como objectivo, pelo menos como consequência perversa, a eliminação da culpa e... da liberdade.
Mas claro, como diz o povo para os constrangimentos de atitude na vida social, «à vontade não é o mesmo qque à vontadinha». E o triunfo maior pode bem ter cores pouco vivas - ser a ultrapassagem de instintos.